Moro aqui e de cá raramente saio. Aqui passo muito
do meu tempo. De vez em quando gosto de descer à cidade e ir ao encontro de
jovens inseguros e solitários que queiram por um momento ser felizes. Atestar
aquele ponto minúsculo que permanece imóvel apenas à espera que o atinjamos sem
nada fazer para se afastar de quem o quer confrontar. – Estamos então na rua
do amor e vejo Jim suspirar em silêncio, verdadeiramente empenhado em saber o
que vai acontecer enquanto nos aventuramos por ali adiante. A rua do amor tem
uma casa e um jardim e de repente tudo o que conhecemos deixa de fazer sentido
porque tudo ali é diferente. Mágico. Misterioso. E eu quero e Jim também, ver
mais,
Posso tornar-me invisível ou
muito pequeno.
Posso tornar-me gigantesco &
alcançar as
coisas mais longínquas. Posso mudar
o curso da natureza.
Posso colocar-me em qualquer lugar
no
espaço ou no tempo.
Posso convocar os mortos.
Posso percepcionar o que aconteceu
noutros mundos,
no mais fundo da minha mente,
& nas mentes dos outros.
A rua do
amor tem vestidos (com mulheres belas
dentro), a rua do amor tem macacos (que
saltam e pulam que nem loucos frenéticos) atrás dos vestidos (com mulheres belas dentro) e que lhes
levantam as saias sem que elas se importem deixando desnudadas as pernas também
belas que existem dentro daqueles vestidos, a rua do amor tem lacaios
preguiçosos enfeitados com diamantes, como Jim e eu, ao que parece, mas sem os
diamantes, ou talvez os diamantes sejam aqueles vestidos (com mulheres belas dentro) tal como aquela que ali nos levou até à
rua do amor. E ela é sábia e sabe o que fazer e tudo faz com a maior das
descontrações e nós na ânsia de não perdermos nada achamo-nos perdidos por
tantas coisas que temos de observar ao mesmo tempo. Mas nem isso nos importa.
Seguimo-la. Estamos possuídos. Ela tem-nos. O nosso desejo aumenta. A partir
dali somos propriedade daquela mulher. Quase sinto um orgasmo pelo cheiro e
pelas cores que nos envolvem naquele instante. A rua do amor é mágica. E
misteriosa. Como aquela mulher que ali nos levou e agora nos revela que aqui
vive. E nós ficamos com a certeza que ela é por aquelas bandas uma pessoa
importante pelos cumprimentos e saudações, quase vénias, que lhe fazem enquanto
passam levando-nos a nós como se fossemos os seus animais de estimação do
momento para quem todos sorriem, sobretudo as mulheres belas que vão dentro dos
vestidos. De repente paramos junto a uma casa, mais parece uma mercearia, ou um
bar, talvez um bordel. Olhando para o interior reparamos que lá se encontram
dezenas de mulheres iguais ou parecidas com aquelas com que nos cruzámos e
homens como Jim e eu (lacaios,
certamente) e ficamos por momentos a imaginar o que farão eles lá dentro. – Eu acho que gosto disto – resolvi
finalmente dizer depois de tanto tempo em profundo silêncio. Olhei Jim que me
respondeu com um ligeiro sorriso transviado ao mesmo tempo que também ele
espreitava para o interior daquela… coisa. –
Até agora – acrescentei.
A grande auto-estrada
está
cheia
d’
amantes
&
pretendentes
&
desistentes
tão
ansiosos
por
agradar
&
esquecer.
E fomos
finalmente convidados a entrar - por aquela mulher. Claro que obedecemos. – Bem-vindos a minha casa – disse-nos a
que ali nos levou quando já estávamos porém no seu interior, que agora
vislumbrávamos decentemente, enorme e extravagante mansão apinhada de gente por
todos os lados. A ela se dirigiram inúmeras pessoas para a saudar. E pela
primeira vez escutámos aquele que seria o seu nome – Baby – ou aquele por que era conhecida por ali. Ridículo. Mas era
utilizando-o que dela se aproximavam para de seguida a beijarem longamente na
boca. Um a um, todos o fizeram, utilizando a própria língua para saborear a
daquela mulher que lhes correspondia da mesma forma. Eles e elas. Os que
estavam presentes. E depois nós. Jim e eu. Por todas aquelas mulheres e homens
fomos saudados da mesma forma. E o que nos pareceu ao primeiro e segundo beijo
uma forma estranha de nos ficarem a conhecer logo se tornou na situação normal como
se exercida por alguém que desempenha uma qualquer tarefa corriqueira
relacionada com trabalho. Andámos mais de uma hora naquilo, saindo dos braços e
das línguas de uns e outros até chegar ao fim da linha que entretanto se tinha
formado para aquilo que parecia um ritual de chegada de nova gente àquela casa.
– É assim que nos saudamos aqui na rua do
amor – disse-nos Baby quando chegámos perto dela exaustos e a suplicar por
um sofá onde nos pudéssemos esticar e ao mesmo tempo beber um copo cheio de gin
que pudesse ajudar a tirar rapidamente tantos sabores que eram sentidos naquele
momento dentro das nossas bocas. – Mas
quem és tu? – perguntei na esperança de ouvir algo que ainda não soubesse. – Eu sou Baby – respondeu – e esta é a vossa oportunidade para amar
como nunca amaram nada nem ninguém. Aproveitem – e afastou-se deixando-nos
entregues a nós próprios no meio de toda aquela gente desconhecida e com alguns
estranhos métodos de actuação. Sentámo-nos finalmente com dois copos bem cheios
nas mãos que emborcámos num piscar de olhos e sem desperdiçar tempo pegámos
noutros dois. Só então começamos a olhar atentamente em nosso redor.
(continua)
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