Passou uma hora desde que
me sentei naquela mesa da Bonnie &
Clyde com as suecas. Muita conversa, muitos risos, algumas trocas de
olhares mais maliciosos a uma e a outra sem no entanto ser descarado e nem
demos conta que a discoteca foi aos poucos esvaziando. A música já tinha mudado
radicalmente. Eram três e meia da manhã e à nossa volta restavam apenas meia
dúzia de casais que iam abanando a cabeça ao som de Bryan Adams, Springsteen,
U2 e coisas do género, naquela que era, definitivamente, a hora das recordações
mais eléctricas da década de oitenta. Outros solitários resistiam junto às
extremidades da pista de dança com garrafas de cerveja na mão esquerda ao mesmo
tempo que simulavam tocar guitarra com a direita roçando-a junto aos bolsos das
calças.
Durante aquele tempo
fiquei a saber que eram divorciadas, amigas, colegas de trabalho há bastante
tempo e passavam férias sempre juntas desde que se tinham separado dos
respectivos maridos. As vidas de Agnetha e Anni eram muito similares. Nascidas
em Estocolmo, aquela era a segunda vez que estavam em São Martinho do Porto.
Gostaram tanto que resolveram voltar. Coisa rara, como me contaram, já que
todos os anos, durante as férias, optavam por conhecer um novo país, uma nova
cidade, outra cultura. Agnetha tinha quarenta e três anos e um filho com vinte
que estava algures de férias com o pai. Anni, dois anos mais nova, tinha duas
filhas que fora dos tempos de escola preferiam andar de comboio e de cidade em
cidade com os amigos. Naquela altura estariam acampadas algures no interior de
Itália. Pelo meio do que se foi dizendo naquela mesa e à medida que a
cumplicidade entre os três ia aumentando atrevi-me a questioná-las sobre o modo
como encaravam o amor, o sexo e a importância que davam aos relacionamentos
passageiros que já tinham vivido durante aquelas viagens de férias que faziam
juntas. Sempre disponíveis a responder a tudo e sem rodeios, foram ao longo da
conversa dizendo que viviam todos os momentos da vida da forma que lhes
convinha e como lhes apetecia em cada circunstância.
A certa altura, talvez
acelerado pelo uísque que já tinha bebido, senti-me cheio de confiança para
atirar a pergunta para cima da mesa sem medo que ela pudesse transbordar e se
estatelasse no chão que pisávamos:
- Passarmos esta noite na
mesma cama, a conversar, claro, está fora de questão?
Olharam na direcção uma da
outra e deram uma risada antes de Agnetha aproveitar para roçar a mão na minha
perna enquanto soltava duas palavras no mínimo prometedoras.
- Quem sabe?
Finalmente, coincidindo
com a entrada barulhenta de um disco de Joe Satriani que nos impedia de
continuar a conversar como até ali, resolvi perguntar se ainda queriam ficar
mais tempo ou se achavam que estava na hora de ir embora. De imediato ambas se
levantaram.
Já no exterior da
discoteca e enquanto parei por breves segundos para acender um cigarro, elas
afastaram-se ligeiramente e reparei que cochichavam algo que não consegui entender.
Por fim, soltaram gargalhadas, estridentes, quase acordando as pedras da
calçada.
- Posso saber qual é a
piada? – perguntei, curioso.
- Queres mesmo? – disparou
Agnetha ainda perdida de riso.
- Claro.
- Anni estava a dizer que
os teus olhos são capazes de provocar orgasmos. Eu perguntei-lhe se ela se
importava de ficar com os olhos – continuou Agnetha sem conter outro par de
risadas que ecoaram por aquelas ruas desertas de São Martinho do Porto.
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