segunda-feira, 16 de maio de 2016

Agnetha e Anni


Passou uma hora desde que me sentei naquela mesa da Bonnie & Clyde com as suecas. Muita conversa, muitos risos, algumas trocas de olhares mais maliciosos a uma e a outra sem no entanto ser descarado e nem demos conta que a discoteca foi aos poucos esvaziando. A música já tinha mudado radicalmente. Eram três e meia da manhã e à nossa volta restavam apenas meia dúzia de casais que iam abanando a cabeça ao som de Bryan Adams, Springsteen, U2 e coisas do género, naquela que era, definitivamente, a hora das recordações mais eléctricas da década de oitenta. Outros solitários resistiam junto às extremidades da pista de dança com garrafas de cerveja na mão esquerda ao mesmo tempo que simulavam tocar guitarra com a direita roçando-a junto aos bolsos das calças.

Durante aquele tempo fiquei a saber que eram divorciadas, amigas, colegas de trabalho há bastante tempo e passavam férias sempre juntas desde que se tinham separado dos respectivos maridos. As vidas de Agnetha e Anni eram muito similares. Nascidas em Estocolmo, aquela era a segunda vez que estavam em São Martinho do Porto. Gostaram tanto que resolveram voltar. Coisa rara, como me contaram, já que todos os anos, durante as férias, optavam por conhecer um novo país, uma nova cidade, outra cultura. Agnetha tinha quarenta e três anos e um filho com vinte que estava algures de férias com o pai. Anni, dois anos mais nova, tinha duas filhas que fora dos tempos de escola preferiam andar de comboio e de cidade em cidade com os amigos. Naquela altura estariam acampadas algures no interior de Itália. Pelo meio do que se foi dizendo naquela mesa e à medida que a cumplicidade entre os três ia aumentando atrevi-me a questioná-las sobre o modo como encaravam o amor, o sexo e a importância que davam aos relacionamentos passageiros que já tinham vivido durante aquelas viagens de férias que faziam juntas. Sempre disponíveis a responder a tudo e sem rodeios, foram ao longo da conversa dizendo que viviam todos os momentos da vida da forma que lhes convinha e como lhes apetecia em cada circunstância.

A certa altura, talvez acelerado pelo uísque que já tinha bebido, senti-me cheio de confiança para atirar a pergunta para cima da mesa sem medo que ela pudesse transbordar e se estatelasse no chão que pisávamos:

- Passarmos esta noite na mesma cama, a conversar, claro, está fora de questão?

Olharam na direcção uma da outra e deram uma risada antes de Agnetha aproveitar para roçar a mão na minha perna enquanto soltava duas palavras no mínimo prometedoras.

- Quem sabe?

Finalmente, coincidindo com a entrada barulhenta de um disco de Joe Satriani que nos impedia de continuar a conversar como até ali, resolvi perguntar se ainda queriam ficar mais tempo ou se achavam que estava na hora de ir embora. De imediato ambas se levantaram.

Já no exterior da discoteca e enquanto parei por breves segundos para acender um cigarro, elas afastaram-se ligeiramente e reparei que cochichavam algo que não consegui entender. Por fim, soltaram gargalhadas, estridentes, quase acordando as pedras da calçada.

- Posso saber qual é a piada? – perguntei, curioso.

- Queres mesmo? – disparou Agnetha ainda perdida de riso.

- Claro.

- Anni estava a dizer que os teus olhos são capazes de provocar orgasmos. Eu perguntei-lhe se ela se importava de ficar com os olhos – continuou Agnetha sem conter outro par de risadas que ecoaram por aquelas ruas desertas de São Martinho do Porto.

                                                                                                           (continua)

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